O homem e a solidão da mentira
"O pior não é ser-se desmascarado. É não se ser desmascarado".
Os homens têm uma certa propensão para mentir e esconder no contexto da relação heterossexual (o único que conheço). São mentiras brancas, quase verdades. Parecem mentiras de adolescente que se contam às mães quando se vai beber uns copos com os amigos e se quer ficar até mais tarde.
Conheci poucos homens que não mentissem ou escondessem: histórias sobre ex-namoradas, amigas, coisas que não fizeram mas deviam ter feito, coisas que fizeram mas não deviam ter feito, os seus problemas, as suas tristezas, a ordem das coisas, a origem das coisas. Mentiras brancas, inofensivas - mas, sobretudo, defensivas.
Ah, mentem porque as mulheres são inseguras, dirão. Ou será que as mulheres são inseguras porque os homens mentem?
Esta necessidade de mentir ou esconder parece vir de um medo da exigência e da complexidade emocional das mulheres, mesmo que nada lhes seja cobrado. Medo, também, de perder a sua individualidade no contexto da relação, uma individualidade que os liga inexoravelmente à juventude, às coisas que sempre gostaram de fazer sozinhos. Vem também da incapacidade de criarem uma verdadeira relação de comunicação e intimidade, em que a verdade não afecte essa individualidade; em que, pelo contrário, a promova e enalteça. Não acreditam que isso seja possível.
Antes que digam coisas: as mulheres também o fazem, claro. Toda a gente mente, toda a gente esconde. Mas há algo neste tipo de mentira branca, inconsciente, automática e gratuita, ligada à identidade do homem, sobretudo no contexto da família, e que terá provavelmente origem na sua educação (mentir é melhor que ser vulnerável) e na relação com a mãe (que nunca quererá desiludir), que merece reflexão.
Hoje vi O Adversário. Já tinha lido o livro, mas nunca tinha visto o filme. É a história verídica de um homem que, ao longo de 15 anos, diz que tem um curso que não tem, um emprego que não tem, dinheiro que não tem. Diz aos amigos, à mulher, aos filhos, aos pais. É o medo da verdade e a vergonha da mentira levada ao extremo da loucura.
Não vou spoilar. Serve apenas de mote para um exercício de consciência que vos proponho: o de controlarem esse impulso antes de se enredarem no medo de serem quem são junto de quem vos ama. Mesmo que seja nas pequenas coisas, no que vos pareça que é proteger ou protegerem-se, no que vos pareça que é fazer o bem. No que vos pareça ser por amor.
A mentira é condescendente. Piedosa só por pena de vós mesmos. E encurrala-vos numa tremenda solidão.
Mentir para se salvar de si mesmo…. mentir para se iludir… mentir para fugir do sentir. 😞
Ah, primeiras. Caramba, fiquei curiosa com o filme.